As autorizações concedidas pelo Estado de São Paulo para queima controlada da palha da cana-de-açúcar, na região de Jaú/SP, foram suspensas hoje (20/8), por decisão liminar proferida pelo juiz federal substituto da 1ª Vara de Jaú, José Maurício Lourenço (ação civil pública nº 2007.61.17.002615-9).
Segundo o Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público Estadual (MPE), autores da ação, o Estado de São Paulo procedeu de forma ilegal e inconstitucional ao autorizar a queima controlada sem que houvesse antes a exigência de estudo de impacto ambiental, previstos na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (nº 6.938/81) e na Resolução 237/97 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).
Para o juiz José Lourenço, a farta documentação constante nos autos demonstra a necessidade urgente da liminar. “A presente medida reclama por rapidez, haja vista que a despalha da cana-de-açúcar por meio de queima encontra-se em plena atividade na região”, disse.
Os efeitos expansivos da queima da cana foram destacados no pedido formulado pelo Ministério Público. Trechos do trabalho científico desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais apontam que as emissões de queimadas “alteram o balanço radioativo da atmosfera (...), causam a liberação de ozônio e grandes concentrações de monóxido de carbono (CO) e dióxido de carbono (CO2), que afetam a saúde dos seres vivos, reduzindo também as atividades fotossintéticas dos vegetais, prejudicando a produtividade de diversas culturas (...); destruição da camada de ozônio e contribuindo com o efeito estufa”.
Na opinião de José Lourenço, a fiscalização sobre a atividade da queima da cana-de-açúcar deve ser, de fato, do IBAMA, “haja vista a expansão dos efeitos desta prática em toda a atmosfera, ultrapassando em muito os impactos meramente locais”. Para ele, constatada a inação dos órgãos estaduais competentes quanto ao prévio licenciamento ambiental para aquelas atividades que oferecem risco ao meio ambiente, “deve entrar em cena a competência licenciadora supletiva do IBAMA”.
O juiz afirma que em virtude do caráter poluidor, a queima traz consigo inúmeros prejuízos socioambientais. “Não é necessário ser especialista para perceber que as queimadas, procedimento antinatural, constituem atividade poluidora, pois responsável pela liberação de gases poluentes no meio ambiente. E por requerer uma técnica simples de execução, daí, de baixíssimo custo, vem sendo utilizada em larga escala na nossa região e no Brasil em geral”.
Para José Lourenço, os princípios da preservação ambiental e da saúde humana devem se sobrepor aos interesses econômicos dos usineiros e produtores do álcool. “Não se trata aqui de inviabilizar ou impedir a prática econômica da produção do álcool, mas apenas de adaptá-la aos ditames constitucionais no que tange à manutenção e proteção de um meio equilibrado”.
O juiz considerou inconstitucional o Decreto nº 2.661/98, editado pelo presidente da República, que criou a chamada “queima controlada”. Na opinião de José Lourenço, o decreto extrapolou o conteúdo da lei que objetivava regulamentar, “ao autorizar indiscriminadamente o emprego do fogo nas práticas agropastoris e florestais, sem exigir como condição para a autorização da queima o necessário estudo de impacto ambiental, tal como exigido pela Constituição Federal de 1988”.
Em seu entendimento, as “autorizações” que vêm sendo concedidas pelos órgãos do Estado de São Paulo aos usineiros e proprietários rurais para a prática da queima da palha não podem subsistir, pois são irregulares. “A competência para a fiscalização desta atividade e conseqüente licenciamento ambiental é reservada ao IBAMA. Logo, não podem os órgãos estaduais expedir eventual ‘autorização’ para esta prática, sob pena de usurpação de competência. E ainda que assim não fosse, a segunda irregularidade diz respeito à ausência do indispensável e prévio estudo de impacto ambiental”.
Diante disso, o juiz deferiu o pedido de tutela antecipada e determinou a suspensão imediata das autorizações já concedidas pelo Estado de São Paulo para a queima controlada da palha de cana-de-açúcar, na área compreendida pela Subseção Judiciária de Jaú (*), bem como a paralisação desta prática na região. Determinou, ainda, que o Estado de São Paulo se abstenha de novas “autorizações” para a prática da “queima controlada”, e que o licenciamento ambiental seja promovido exclusivamente pelo IBAMA. Em caso de descumprimento da decisão, será aplicada multa diária no valor de R$ 10 mil. (RAN)
(*) Jurisdição de Jaú: Bariri, Barra Bonita, Bocaina, Brotas, Dois Córregos, Igaraçú do Tietê, Itaju, Itapuí, Jaú, Mineiros do Tietê, Santa Maria da Serra e Torrinha.