A juíza federal Silvia Figueiredo Marques, da 26a Vara Cível Federal de São Paulo/SP, julgou procedente a ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) para impedir o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de cancelar sanções aplicadas no estado de São Paulo relativas à supressão, corte e/ou utilização não autorizados da vegetação remanescente em áreas da Mata Atlântica. A sentença é do dia 30/8.
De acordo com o MPF, mesmo com a revogação de um despacho assinado pelo então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que invalidava uma série de punições, milhares de autos de infração e termos de embargos vinham sendo cancelados devido à falta de orientação que buscasse restabelecer o entendimento anterior sobre a utilização da Mata Atlântica (Lei no 11.428/2006).
Ressaltou, ainda, que o Código Florestal é mais brando, em especial no que diz respeito às disposições relativas ao uso consolidado em Áreas de Proteção Permanente (APP), e que vinha ocorrendo abstenção indevida na tomada de providências, pelos órgãos ambientais fiscalizadores, bem como do regular poder de polícia em relação a desmatamentos ilegais ocorridos nestas áreas. Além disso, afirmou que existe uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no 6446 pendente de julgamento.
Em sua manifestação, o Ibama contestou a demanda afirmando que há conexão entre a ação civil pública e a ADI 6446 ajuizada pelo presidente da República, que tem por finalidade declarar a nulidade parcial de artigos do Código Florestal, de modo a excluir do ordenamento jurídico interpretação inconstitucional de dispositivos que impedem a aplicação do regime ambiental de áreas consolidadas a áreas de preservação permanente inseridas no bioma da Mata Atlântica. Disse, também, não ter ocorrido cancelamentos de autos de infração em razão de desmatamentos não autorizados. Para isso, teria de ter ocorrido a adesão formal ao Programa de Regularização Ambiental no âmbito dos estados-membros.
“Se a própria Administração entendeu ser conveniente se aguardar a decisão a ser proferida na ADI, para que haja uma solução definitiva para a questão das terras situadas na região da Mata Atlântica, enquanto tal decisão não for tomada pela Suprema Corte, deve-se entender pela proteção destas terras. Isso porque, mantendo-se a área protegida, se, depois, o STF afirmar que o Código Florestal deve prevalecer e as disposições atinentes ao uso consolidado das áreas nas Áreas de Preservação Permanente (APP) se aplicam à Mata Atlântica, não deverá haver maiores problemas. Mas, se, ao contrário, os autos de infração e outras medidas tendentes a proteger as áreas não forem sendo tomadas até o referido julgamento e, por hipótese, o STF entender que a Lei da Mata Atlântica deve se sobrepor ao Código Florestal, aí poderá ser tarde demais e haver danos irreversíveis”, afirma a juíza na decisão.
Silvia Figueiredo Marques ressalta que é mais prudente preservar as terras enquanto é possível. “Se, no futuro, entender-se que se pode ou se deve dar outro destino às áreas que não seja apenas a preservação, aí, sim, devem cessar as medidas tendentes a punir eventuais ocupações ou infrações [...]. Entendo, portanto, que as medidas com o objetivo de preservar a Mata Atlântica devem ser mantidas até que a Suprema Corte decida a ADI apresentada pelo presidente da República. Diante do exposto, julgo procedente a presente ação para condenar o réu na obrigação de não fazer, consistente em se abster de cancelar autos de infração ambiental, termos de embargos e interdição, e termos de apreensão, lavrados no estado de São Paulo, a partir da constatação e/ou utilização não autorizados, de vegetação do bioma Mata Atlântica. Confirmo, pois, a tutela anteriormente concedida”. (RAN)
Ação Civil Pública nº 5020189-24.2020.4.03.6100 – íntegra da decisão